Blog

A abusividade na negativa de cobertura pelo Plano de Saúde

A abusividade na negativa de cobertura pelo Plano de Saúde

No Brasil, frente à histórica carência de vagas, infraestrutura e de especialistas no Sistema Único de Saúde – SUS, os brasileiros muitas vezes optam por investir em planos de saúde privados com o objetivo de garantir atendimento célere e de qualidade quando necessário. Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde 2019, realizada pelo IBGE, quase 60 milhões de pessoas, o que representa pouco menos de 30% da população, possuíam algum plano de saúde médico ou odontológico.

Os custos, todavia, são altos e, infelizmente, proporcionais à idade e as comorbidades do beneficiário, o que muitas vezes torna o acesso ao plano de saúde um investimento importante e oneroso no orçamento familiar. Neste cenário, a negativa de atendimento ou de cobertura de determinado procedimento pela operadora de saúde no momento mais necessário causa indignação e desespero ao usuário que contratou o plano contando com a certeza do atendimento.

As negativas de cobertura e de autorização para realização de procedimentos comumente se fundamentam no argumento de que o procedimento não consta no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, atualmente definido pela Resolução Normativa n.º 465/2021. Ocorre que, diversas vezes, o procedimento mais moderno, mais indicado frente às comorbidades ou que apresenta menores riscos à vida do paciente, não consta no Rol da ANS.

A urgência na realização de cirurgias e outros procedimentos vitais à sobrevivência do beneficiário fazem com que não haja outra saída a não ser buscar o provimento do judiciário para obter a autorização e o custeio.

O ajuizamento de ação judicial para garantir o direito à saúde constitucionalmente garantido frente à negativa de plano de saúde fundamenta-se no argumento de que o plano pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de tratamento utilizado para a cura de cada enfermidade, cabendo ao médico que acompanha o paciente a definição do melhor tratamento a ser indicado, sob sua responsabilidade. O Rol de Procedimentos da ANS tem conteúdo mínimo e é meramente exemplificativo. É óbvia a impossibilidade de uma única lista, que se diz mínima, prever a totalidade dos procedimentos, serviços e atendimentos demandados por todas as enfermidades existentes.

A negativa pelo plano de saúde do melhor tratamento a ser utilizado, definido pelo médico do beneficiário, representa descumprimento contratual, ofensa ao Código de Defesa do Consumidor – CDC, tendo em vista tratar-se de relação de consumo, e figura-se como abusiva e contrária à Lei dos Planos de Saúde, Lei n.º 9.656/98, quando não configurar exceção ao art. 10 da Lei. São exceções e podem basear a negativa de cobertura, por exemplo, o tratamento experimental, o procedimento para fins estéticos, o fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados, entre outros. A referida Lei dos Planos de Saúde, inclusive, estabelece em seu art. 35-C, I e II, que “(…) é obrigatória a cobertura do atendimento nos casos (…) de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizada em declaração do médico assistente” e “de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional”.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ, cujo entendimento deve ser seguido pelos tribunais estaduais, como é o caso do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul – TJRS, já consolidou que “é abusiva a cláusula contratual que exclua da cobertura do plano de saúde algum tipo de procedimento ou medicamento necessário para assegurar o tratamento de doenças previstas pelo referido plano[1]”. Em recente decisão referente à implante de prótese aórtica, que foi negado pelo plano de saúde, a conclusão foi a de que “a ausência de determinado procedimento médico no rol da ANS não afasta o dever de cobertura por parte do plano de saúde, quando necessário ao tratamento de enfermidade objeto de cobertura pelo contrato[2]”.

Lamentavelmente, a negativa de cobertura abusiva pelos planos de saúde é uma prática usual e frequente, que deve, evidentemente, ser combatida. O beneficiário deve buscar aconselhamento jurídico para analisar o seu caso em concreto e identificar se o indeferimento de sua solicitação foi ou não abusivo, com o intuito de garantir o seu direito à saúde e o acesso ao melhor tratamento disponível para a sua enfermidade com o objetivo de salvaguardar o seu bem mais precioso, a vida.

 

Por Diogo Petter Nesello | OAB 89.824.

[1] Jurisprudência em Teses – Edição n.º 2: Plano de Saúde

[2] AREsp 1303945

Compartilhe